15 de setembro de 2010

Do Jornal de Notícias retiro dois artigos de opinião de Manuel António Pina.

O primeiro relativamente à cobertura mediática do Processo da Casa Pia, mais precisamente do programada RTP 1 "Prós e Contras".

Jornalismo de "serviço"

2010-09-08

A entrevista "non stop" que, desde que foi condenado, Sua Inocência tem estado ininterruptamente a dar às TVs teve o mais respeitoso e obrigado dos episódios na RTP1, canal que é suposto fazer "serviço público".

Desta vez, o "serviço" foi feito a um antigo colega, facultando-lhe a exposição sem contraditório das partes que lhe convêm (acha ele) do processo Casa Pia e promovendo o grotesco julgamento na praça pública dos juízes que, após 461 sessões, a audição de 920 testemunhas e 32 vítimas e a análise de milhares de documentos e perícias, consideraram provado que ele praticou crimes abjectos, condenando-o à cadeia sem se impressionarem com a gritaria mediática de Suas Barulhências os seus advogados, o constituído e o bastonário.

Tudo embrulhado no jornalismo de regime, inculto e superficial, de Fátima C. Ferreira, agora em versão tu-cá-tu-lá ("Queres fazer-lhe [a uma das vítimas] alguma pergunta, Carlos?"). O "Prós & Contras" só não ficará na História Universal da Infâmia do jornalismo português porque é improvável que alguém, a não ser os responsáveis da RTP, possa chamar jornalismo àquilo.

O segundo com prende-se com a actuação do Bastonário da Ordem dos Advogados.

Sem sombra de pudor

2010-09-15

Provavelmente já poucos levam a sério o bastonário dos advogados, tantas vezes ele grita "Lobo! Lobo!" e tantas vezes, mal sobe à cena algum espectáculo mediático, salta para o palco a proclamar o fim do Mundo.

Gente que todos os dias anuncia a chegada dos bárbaros precisa permanentemente de catástrofes que lhe permitam aparecer na Ágora com "as suas togas vermelhas, de finos brocados /(...)/ e refulgentes anéis de esmeraldas esplêndidas". Não havendo catástrofes, inventa-as.

Ou, como Marinho e Pinto, deita os fogos que depois entusiasticamente corre a apagar. Assim, poucos dias após ter participado na TV na absolvição mediática de Carlos Cruz, sentenciando de "brutais", apesar de desconhecer inteiramente o processo, as penas aplicadas aos condenados pelo abuso sexual dos "rapazes" (a afectuosa expressão é do referido Cruz) da Casa Pia, Marinho e Pinto escreve sem sombra de pudor no JN que "só acredit[a] na justiça quando ela é feita no lugar próprio que são os tribunais, por magistrados e advogados independentes e não nos órgãos de comunicação social". Advogados "independentes", diz ele...


9 de setembro de 2010

Sou Advogado, e desde cedo aprendi que não se devem pessoalizar os problemas dos clientes. Defende-los com toda a nossa convicção, sim, mas nunca tomar os seus problemas como nossos. Não posso concordar com as declarações nem com a postura assumida pelo Dr. Sá Fernandes. Não são deontologicamente correctas e por isso representam uma grave violação das regras do Estatuto da Ordem dos Advogado.

O que tem feito e o que tem dito ultrapassa, em muito, os direitos e deveres que um advogado tem no patrocínio do seu cliente. Os processos são para ser discutidos nos tribunais e no próprio processo. O não concordar com a decisão do juiz deve e só pode ser demonstrada no processo e perante as autoridades próprias, que são os tribunais superiores.

Não deve, nem estatutariamente pode, um advogado estar a trazer para a rua o processo, nem pode manifestar, publicamente, de forma absolutamente buçal e ofensiva, o seu inconformismo com uma decisão judicial, por muito absurda que ela possa ser ou parecer.

O Advogado deve, em toda a sua actuação, manter uma postura de elevação e de respeito para com todos os intervenientes processuais, quer dentro da sala de audiência, quer fora dela. Assim obriga o dever de urbanidade.

Que não se conforme com a decisão, parece-me bem, para isso existem os recursos e os tribunais superiores. Não me parece nada bem que através da demagogia se procure obter na praça pública o que não conseguiu obter no tribunal.

Espero, como advogado, que a Ordem que nos representa retire as devidas consequências da actuação deste advogado e tome as devidas providências para a sua responsabilização disciplinar. Só assim se consegue dignificar a justiça e os advogados.

Ainda sobre este assunto, "roubo" este texto do blogue sine die, com o qual concordo plenamente:

05 Setembro 2010

As trevas do dr. Fernandes

"Trevas", "terror", "fascismo", "tribunais plenários"... Não, não é o Sr. Artur Albarran. São os termos usados pelo dr. Fernandes, um Sr. advogado de ar grave, para caracterizar o sistema judicial pátrio do qual, ao que parece, nem ele e nem o dr. Pinto fazem parte. Parece ainda, segundo o tal Sr. advogado de ar grave, que o acórdão é o "reflexo de um dos países mais atrasados..." Pergunto: alguém faz a fineza de explicar a este Sr. advogado de ar grave, um homem genuinamente preocupado com a Justiça e com a Democracia, que em alguns dos outros países que o mesmo terá como muito "mais avançados" do que Portugal o seu cliente porventura não sairia do tribunal com uma pena de 7 anos de prisão, mas antes com uma de 70? Que em muitos deles, um bom número deles, o dito cliente não sairia dali para uma conferência de imprensa em horário nobre, mas antes iniciaria de pronto a execução da pena e sem prejuízo de recurso? Que não é em todos os ditos países "avançados" que poderia apresentar magotes de testemunhas e outros tantos requerimentos, longos como léguas, ao longo de um julgamento? Que também em muitos dos países "avançados" que o mesmo porventura tivesse presentes no cerebelo ao proferir declarações descabeladas, não lhe seriam consentidos, sem prontas consequências disciplinares, dislates como aqueles que faz questão de nos prodigalizar de forma contumaz em prime time televisivo? Que também em alguns países civilizados, daqueles onde as pessoas se lavam, não seria possível, encontrar alguns canais de TV, como temos por cá, prontos a, reiteradamente, dar voz em horário nobre a uma pessoa condenada - por 3 juízes, na sequência de um julgamento de anos e ao que parece com superávite de garantias processuais - a 7 anos de prisão por crimes sexuais sobre menores? E, ainda, de entre o muito mais que se lhe poderia (deveria) explicar, que em alguns dos países em que a Justiça é um paraíso, nomeadamente uns que não raro são alcandorados a paradigma a copiar pelos tudólogos indígenas, o tribunal nem tem (ao menos no momento da prolação da decisão) obrigação de "dar razões" no caso de condenação? Alguém faz a fineza de explicar isso, com as letras todas, àquele Sr. advogado de ar grave?

Publicado por Pedro Soares de Albergaria (17:57)