11 de fevereiro de 2007

Tudo Pequeno

«Supreende-me e irrita-me -pois pertenço a essa espécia o humilde contentamento dos homens. Falam a todo o momento de grandezas - the biggest in the world - e a seguir descobre-se que lhes parece imensa qualquer modesta pequenez. Falta, em absoluto, a todos, o senso do gigantesco. Falam como Sansões e agem como o Pequeno Polegar.

Uma estátua da altura de sessenta metros parece, a seus olhos, um colosso; uma casa de cento e cinquenta, um desafio ao céu; uma torre de trezentos, um portento único; uma ponte da extensão de mil metros, uma vitória do génio humano. Uma cidade inde vivem seis ou sete milhões de homens - isto é, cem vezes mais deserta do que alguns formigueiros - faz o efeito de uma metrópole imensa; e uma população de cem milhões parece interminável. Nunca vi pobres tão extasiados diante das obras de empresários tão mesquinhos. Quando me vi pela primeira vez ao pé da Torre Eifel, não pude deixar de rir: Aquela desilegante gaiola de ferro, que parece um brinquedo de engenheiros, abandonado perto de um regato, era, realmente, a construção mais alta da Terra? É caso para ter vergonha de ser homem e de ter nascido neste século.

S. Pedro de Roma é, ao que dizem, a maior igreja do Mundo e tem, pelo menos, como vestíbulo, uma praça que podia ser o modelo reduzido de um dos meus sonhos. Mas quando se entra na nave fica-se desiludido. Isso é tudo? Em poucos passos, encontramo-nos sob a cúpula: não quero dizer que seja feia, uma vez que os especialistas a admiram, mas as dimensões são incrivelmente miseráveis. Se o Imperador do Mundo construísse um palácio real digno dele, um a cúpula como a de Miguel Ângelo poderia, quanto muito, ser a abóbada de um átrio de serviço. Quanto ao coliseu, seria, imagino, um pequeno pátio de passagem para as cozinhas.

É possível que os babilónios e os egípcios tivessem, um pouco mais do que nós, a fantasia do grandioso, embora possamos desconfiar das ruínas, que nos podem iludir. Mas os modernos - que possuem meios e mecanismos muito superiores aos antigos - deviam fazer muito mais e não escancarar a boca a vista das intenções mesqueinhas dos nossos arquitectos micrómanos.

Nenhum tem uma imaginação digna da nossa condição de monarcas do planeta. Ter-se-ia, por exemplo, de recomeçar a construção da Torre de Babel, abandonada por uma vil superstição, há milhares de anos. Um torreão de mil metros, que ultrapasse a zona das nuvens e permita contemplar inteiro todo o país a seus pés, não seria empresa impossível para os nossos construtores.

Contentam-se em admirar os navios de duzentos e trezentos metros de comprimento, que transportam, lentamente, através dos mares, alguns milhares de viventes. Mas o navio, em relação à nossa época, devia ser uma ilha autêntica, com jardins plantados em terra verdadeira, com ruas e palácios e destinada, não a andar daqui para alí, de um Continente para outro, mas a tornar possível a carreira regular entre todos os Continentes. Os paquetes de hoje nada mais são do que bacaças a vapor, que farão, dentro de um século, o mesmo efeito que nos fazem as diligências de há cem anos.

Por ora só as palsavras são de titãs, mas as nossas obras são de formigas e toupeira. Até as formigas nos podem dar lições de grandez. O Homem Moderno, apesar da sua jactância, pensa como Gulliver e não se percebe de que vive ao nível de Liliput.»

Nova Iorque, 24 de Janeiro

GOG

de Giovani Papini

4 comentários:

Anónimo disse...

Genial este texto!

Anónimo disse...

Sem sombra de dúvida, um escrito brilhante! Só as palavras serão de titãs…as obras serão de meras formigas e toupeiras!!! …Adequado….Boa escolha!

Um escrito passível de extracção dos mais diversos sentidos.

Como em muito nas nossas vidas, somos desprovidos de capacidade de grandes acções, reacções…Criticamos e menosprezamos grandes feitos de outrem, refugiando-nos na ideia de sermos capazes de mais e melhor, mas…depois…nada! Não actuamos, não reagimos, não construímos, não lutamos…não temos obra, própria, feita! Mas, ainda assim, continuamos incapazes de reconhecer grandeza ao que nos rodeia.

Perdemos a capacidade de nos surpreender…miramos o que nos rodeia com, eventual até, desdém…subestimamos….na vã convicção de que, eventualmente, faríamos melhor, eventualmente, seríamos merecedores de melhor…isto, caso nos déssemos ao trabalho de o fazer…caso decidíssemos enveredar por aí…caso nos decidíssemos dar ao trabalho…mas como custa “dar ao trabalho”, não?

Paradoxalmente, vivemos com um “humilde contentamento”…pois nem ainda que, eventualmente, achando que melhor faríamos…nada fazemos…contentando-nos…parecendo-nos “imensa qualquer modesta pequenez”… e, ainda assim, sempre insatisfeitos…

No fundo, não creio que nos falte “o senso do gigantesco”, falta-nos sim o senso do essencial, …a essência, sim, no fundo saber avaliar a essência do que nos rodeia. A habilidade de saber admirar, contemplar e reconhecer o importante do todo que nos rodeia, e aí quem sabe, o senso do gigante seja outro…quem sabe saberemos retirar importantes lições de grandeza fornecidas por pequenas formigas.

Anónimo disse...

Já dizia o outro que "tudo isto é muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos..."

Anónimo disse...

... palavras? leva-as o vento!
os actos, esses sim! podem representar mil palavras e ser de uma grandeza infinita!